domingo, 11 de janeiro de 2009

Eu aceito



Ricarda era realmente diferente. O sonho da maioria das mulheres é casar de branco e viver feliz para sempre. Ela queria morar sozinha. A maioria delas babam quando vêem uma criança. Ela sempre imaginava-os gorfando e defecando.

Ricarda sempre foi muito independente, desde pequena. Começou a trabalhar aos 16 anos, apesar dos protestos de seu pai, aos 23 foi morar sozinha. Seu sonho sempre foi ser livre e independente e para isso não deveria estar “amarrada” a nada, nem ninguém.

Filhos amarram, cachorros amarram, maridos amarram. Por isso mesmo, torcia o nariz toda vez que suas amigas falavam em casamento.

Ricarda e Joaguim já namoravam há 4 anos e Joaquim era caidinho por ela. Ela também era por ele, só que sempre foi mais durona e não demonstrava tanto. O que ele mais gostava nela era exatamente sua independência, o que mais tarde se revelaria um problema. Se davam bem de um modo geral. Só discutiam quando ele pegava no pé dela.

Ricarda gostava de sair sozinha com as amigas, de beber, dançar, olhar as pessoas e se divertir a valer. Ela não considerava aquele bar de rock uma balada, principalmente porque ele ficava no Bixiga e era meio boteco, com cabeludos bizarros que ainda tentavam se encontrar em meio aos bate-estacas que viraram febre na época.

Joaquim, no entanto, não concordava com isso e sempre ficava mal humorado quando ela anunciava que ia sair com a amiga na próxima sexta-feira. Você podia ao menos me pedir ao invés de apenas me comunicar, dizia ele, visivelmente incomodado. Ela sempre deu de ombros. Simplesmente não era seu estilo. Não conseguiria ser assim, provavelmente nunca. Era bom ele se acostumar.

E ele se acostumou. Claro que não pulava de alegria quando ela dizia que iria sair, mas já não reclamava tanto. Ela também cedeu um pouco e parou de comunicar que sairia, mas também nunca pediu: “amor, posso sair amanhã?” isso soava ridículo para ela.

Ricarda arrumou ume emprego legal e passou a se arrumar mais ao ir trabalhar. Joaquim, ciumento, começou a ficar preocupado em perder o posto de namorado. Ficava imaginando os gaviões dando em cima da sua mulher e começou com uma história de anel de compromisso.

Ricarda achava muito brega aquela história de anel de prata na mão direita. Simplesmente era completamente impossível de aceitar essa proposta. Para acabar com a discussão que sempre entrava em pauta, pois Joaquim era muito teimoso, ela disse que só colocaria um anel de noivado no dedo, de compromisso não iria rolar nem a pau.

Joaquim arregalou os olhos, noivado? Hum, veja bem, isso é muito sério, tem que pensar bem antes de usar uma coisa assim. Ricarda riu e concordou. Pronto, tinha conseguido resolver o problema: acabou a história do anel.

O que ela não imaginava é que Joaquim estava mesmo decidido a ficar com ela e, secretamente começou a olhar vitrines de alianças. Até que se decidiu por uma: tradicional, dourada e com formato anatômico.

Um sábado qualquer, Ricarda estava em sua casa, aguardando o homem da tv a cabo instalar a fiação, porque, com o emprego bacana, finalmente poderia voltar a assistir a programas inteligentes e não só os canais abertos. Mas ela estava furiosa porque não gostava de ficar sozinha em sua casa com homens estranhos e tinha pedido ao seu namorado para ele vir logo cedo ficar com ela.

Ele não apareceu. Disse que tinha que cuidar de um assunto urgente e iria se atrasar um pouco. O moço da tv a cabo chegou, seu namorado, não. Ricarda ligou para ele e perguntou se ele iria demorar, disse que o moço já estava lá, mas ele, não.

Ele desculpou-se e disse que já estava a caminho. Incrivelmente mal humorada, ela desligou o telefone. Quando Joaquim chegou, o moço da tv a cabo já havia ido embora e Ricarda nem olhava direito para Joaquim. Ele se desculpou e disse que tinha tido um problema. Ela, disposta a começar uma discussão, começou a provocá-lo. Queria brigar, estava querendo tirá-lo do sério.

E aí, cadê meu anel de noivado, não vai comprar? Ou você não é homem pra isso? ela disse. Era puro despeito. Estava jogando sujo para deixá-lo incomodado e com sentimento de culpa. Essa era sua especialidade e Joaquim coitado, sempre caía.

Naquele dia, no entanto, ele estava calmo e não se abalou com a provocação. Olhou muito sereno para Ricarda e tirou de sua mochila uma garrafa de prosecco. Ela olhou para ele e disse que não queria beber nem água, muito menos champanhe. Tem certeza? Ele disse.

Mostrou a ela a garrafa, nela havia uma fita da Vivara amarrada. O coração de Ricarda disparou. Percebeu que seu namorado levou a sério a história do anel e iria fazer a tão esperada proposta pela maioria das mulheres, que quer ouvi-la a vida inteira. Eles estavam em pé na sala. Ela com roupa velha, dessas de ficar em casa e ele transpirava, porque estava muito calor.

Minha nossa senhora, é agora ela pensou. Ela estava incrivelmente feliz. Ela então perguntou que fita era aquela amarrada na garrafa. Ele abriu outro compartimento de sua mochila, pegou o estojinho preto e disse: desculpe pelo atraso, eu tinha algo realmente importante e urgente a fazer. Não ia te entregar agora, desse jeito, mas como você está me intimando e duvidando de mim e da minha capacidade, vai ser já.

Virando o estojo em sua direção e olhando em seus olhos, Joaquim abriu-o mostrou o anel a Ricarda. Você quer se casar comigo, ele perguntou. Ela adorou a forma como ele a abordou e, surpreendida por sua felicidade (afinal, nunca se preocupou em casar e na verdade nem pensava muito nisso), respondeu, totalmente sem pensar, sim, eu aceito!

Foi assim que mais um casal se formou. Para Ricarda, foi simplesmente perfeito: nada dessa história de jantar e colocar o anel no meio do pão ou enrolada no guardanapo, ou ajoelhar e pagar mico na frente de todos. Nada disso. Simples, direto e objetivo, como ela gostava. No ano seguinte eles se casaram. Foram a um cartório, assinaram os papéis e rumaram ao restaurante onde os aguardavam os amigos íntimos e os poucos familiares. E assim, Ricarda baixou a guarda e resolveu dividir a sua vida. Sem pompa, sem firula, simples assim.

Filhos ainda não estão nos planos do casal. Ricarda continua associando aos bebes, a imagem de vômito e cocô.

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