domingo, 17 de maio de 2009

Aliança

Sara era noiva de Ricardo havia alguns meses. Justo ela, pensou, que era contra essas convenções sociais. Sempre pregou pelo amor livre. Por amor livre leia-se não a suruba, mas um amor sem as amarras e ficções sociais.

Ricardo, no entanto, foi criado por uma família tradicional e pretendia casar, ter filhos e constituir uma família com Sara. Ela também pretendia tudo isso, mas de uma forma não tão formal.

Um dia, Ricardo apareceu com um estojo e pediu a mão de Sara em casamento. Naquele instante o estrógeno e a progesterona superaram todos os sentimentos e pensamentos de Sara em ter uma família informal e ela disse “sim”. Ficaram noivos por alguns meses e casaram-se em Campos do Jordão, numa casa com um grande jardim.

Num sábado qualquer, Ricardo e Sara resolveram sair para jantar. Sara, apesar de casada, ainda não havia conseguido manter um diálogo amistoso com sua aliança e sempre que chegava em casa, a primeira coisa que fazia era tirá-la.

Ela sempre acreditou que o amor que sentia estava no coração e que aquela argola banhada a ouro, vendida como sonho de felicidade em lojas chiques dos shoppings eram a representação madura dos fetiches de infância das leitoras de contos-de-fada.

Sendo assim, ela tinha em seu aparador, ao lado da porta de entrada do seu apartamento, a garrida para abrigar o símbolo máximo da família na sociedade ocidental. Tendo esse desapego, por algumas vezes esquecia de, ao sair do seu apartamento, colocar de volta ao dedo o seu anel de casamento.

Ricardo não ficava nada satisfeito quando algo do tipo acontecia. Ele considerava falta de consideração esse tipo de atitude. Desse modo, Sara sempre se esforçava em colocá-la e não esquecer o dito anel, jamais.

Ainda sobre o jantar, naquela noite ambos saíram e Sara já no carro, a caminho do restaurante, percebeu que estava sem a aliança. Ficou branca, azul e cinza e pensou em simular um mal-estar, antes que Ricardo percebesse a presepada em que ela mesma havia se enfiado, mesmo porque a aliança de Ricardo estava lá, brilhando em sua mão esquerda.

Fato é que Sara estava com fome. Fez cara de choro e comunicou a Ricardo o ocorrido. Ele não fez cara de felicidade, por óbvio, mas também não fez questão em voltar para casa e pegar a aliança. Foram os dois (um triste e a outra se sentindo culpada), ao restaurante.

Lá chegando, o garçom entregou o cardápio. Ambos pediram a bebida, a entrada e engataram um papo animado. O garçom passou a olhar Sara de um modo não muito habitual. Ela estranhou tal fato, mas achou melhor não comentar ao marido.

Pediram então o prato principal, comeram e Sara percebeu que o garçom cochichava algo com o maitre. Eles soltaram risinhos. Ela então percebeu o que estava rolando. Os dois achavam que ela era a amante de seu marido e não a esposa, como de fato e de direito era.

Sara começou a rir. O marido ficou sem entender. Ela passou a gargalhar. Algo mais surreal que isso, só um quadro do Dali. Foi cômico, senão trágico. Sara então, contou ao marido o que ela tinha descoberto e ambos se divertiram com o fato o resto da noite.

O garçom ficou pensando que aquele casal só se divertia assim por não ter um compromisso sério. Que aquela moça que supostamente estava desagregando e desunindo uma família, não parecia nem um pouco culpada. Pelo contrário, gargalhava à mesa e fazia questão em jantar em público com o marido da outra. Sendo que ele continuava a usar a aliança, objeto esse que testemunhara as juras de amor eterno entre ele e uma coitada que deveria estar em casa, sozinha, sentindo falta de seu homem.

Sara e Ricardo pediram uma sobremesa e duas colheres. Comeram divertidamente aquele doce e adoçaram a boca. Na saída do restaurante, Ricardo, enquanto aguardava o carro, beijou os cabelos de Sara e disse que a amava.

Sara retribuiu o carinho e lhe beijou a boca. O manobrista olhou aquilo indignado. Comentou com o outro amigo, também manobrista que esse mundo estava perdido. Como pode existir tal coisa nesse mundo? Uma pouca-vergonha.

7 comentários:

  1. Pois é. As convenções sociais agregam a humanidade. E todos vivem achando que uma simples aliança pode mesmo significar fidelidade...

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  2. Já passei por isso!
    kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

    Pouco antes da minha filha nascer, eu precisei tirar a minha aliança, já que estava acima do peso e msm estava apertada.

    O problema se deu qdo voltei do hospital e fiquei uns dois meses sem usar. Até que um belo dia, no supermercado, eu e meu ex-marido estávamos fazendo no carinho no corredor, qdo passa uma senhora, olha para nossas mãos..a dele com a aliança e aminha sem..a senhora olhou na minha cara e me chamou de vadia. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

    Claro que o maridão foi lá explicar a tia ficou com cara de furico. srsrrr

    Bjos.

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  3. História real Ana?

    Acho que sim. Uso esse objeto de metal que simboliza o compromisso, mas como você mesmo aborda no seu texto, ele não significa felicidade, apenas demostra algo pra sociedade.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Fui casada, sempre recusei-me a usar aliança e nunca me senti culpada. Nem se eu tivesse casado com um rei ia gostar de carregar uma coroa... O que importa mesmo está na cabeça e no coração. O resto é resto...
    Bela história.
    bjs

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